quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012

As mãos dele já declaravam

As mãos dele já declaravam que é trabalhador. A mochila no colo, as mãos na mochila, os calos nas mãos. As mãos que tinham calos, também tinham restos de cimento, ou talvez de tinta, nos cantos das unhas. As mãos que estavam sobre a mochila seguravam, de forma meio desajeitada, um celular (daqueles relativamente modernos) os fones estavam nos ouvidos e uma das mãos segurava o microfone bem perto da boca. A conversa em tom baixinho foi ouvida. Ele dizia: “avisa aí que eu acho que vou ser mandado embora”. Prosseguiu dizendo: “o encarregado me deixou o dia inteiro sem fazer nada”. O medo da demissão deixava as mãos trêmulas, pois do outro lado alguém ficava preocupada. Então ele com a voz e as mãos trêmulas dizia: “fica calma que tudo vai dar certo, mas eu acho que vou ser mandado em embora”. Ficou triste. O choro estava na garganta. A tristeza não era percebida em meio de tantas outras mentes cansadas em um metrô lotado as cinco e meia da tarde em São Paulo. Se fosse percebida, a tristeza contagiaria a todos. Contagiaria a todos que também conversam baixinho, que tem as mãos com calos, que têm a mochila no colo e que tem o choro na garganta. A tristeza soava como uma tristeza coletiva. Uma tristeza como no “canto das três raças” do Paulo Cesar Pinheiro, cantado com toda alma da Clara Nunes, “ e de guerra em paz, de paz em guerra, todo o povo dessa terra quando pode cantar, canta de dor”. As mãos dele não negavam. Sim, é um trabalhador… É um trabalhador sentindo que perderá seu trabalho. As mãos dele declaravam, as mãos dele não negavam.

Nenhum comentário: